segunda-feira, 29 de agosto de 2011

MANIFESTO CONTRA O INVESTIMENTO DE DINHEIRO PÚBLICO NAS COMUNIDADES TERAPÊUTICAS

O Conselho Regional de Psicologia de São Paulo posiciona-se contra todas as ações de saúde que tratem dos usuários de álcool e outras drogas em instituições com privação de liberdade, que estejam fora da rede de serviços do Sistema Único de Saúde - SUS, que neguem o cuidado de saúde integral, universal e equânime e ferem os princípios de direitos humanos.

As atividades de atenção ao usuário e dependentes de drogas devem visar a melhoria da qualidade de vida e a redução dos riscos e dos danos associados ao uso de drogas, com definição de projeto terapêutico individualizado e ações direcionadas para sua integração ou reintegração em redes sociais, observando os direitos fundamentais da pessoa humana, os princípios e diretrizes do SUS e a Política Nacional de Assistência Social.

O consumo de álcool e outras drogas tornou-se uma preocupação de saúde pública em todo o mundo. No Brasil, atualmente o crack é motivo de grande preocupação tanto da Saúde Pública como de outros setores da sociedade.

Em maio de 2009, com a criação do Plano Emergencial de Ampliação do Acesso ao Tratamento e Prevenção em Álcool e outras Drogas - PEAD, inicia-se um esforço de suprir a ausência histórica de políticas de saúde integral ao consumidor de álcool e outras drogas.

O Decreto nº 7.179, de maio de 2010, ao instituir o Plano Integrado de Enfrentamento ao Crack e outras drogas, tenta suprir a deficiência de uma política de saúde integral. Após este decreto, o Ministério da Saúde, em conjunto com a Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (SENAD), promove editais que destina, entre outros, apoio financeiro a projetos de utilização de leitos de acolhimento para usuários de crack e outras drogas em Comunidades Terapêuticas.Porém, o nome comunidades terapêuticas abarca toda e qualquer instituição que se proponha a "cuidar" do usuário de álcool e outras drogas na forma jurídica que melhor lhe couber, nos princípios e diretrizes dos proprietários dessas formas jurídicas - ONGS, grupos de auto-ajuda, instituições religiosas. Não se tem sobre as comunidades terapêuticas qualquer tipo de lei ou regulamentação, apenas uma portaria da ANVISA. Desta forma, como se daria o monitoramento, controle e avaliação das ações realizadas nestas Comunidades Terapêuticas?

Em um momento em que a Reforma Psiquiátrica Brasileira vem sendo atacada por setores econômicos estratégicos, assistimos ao investimento em 2.500 leitos em instituições que não fazem parte da Rede Substitutiva de Atenção à Saúde Mental do SUS em detrimento da ampliação do número de CAPS-AD II e III e Leitos em Hospitais Gerais. O que se pode observar é que, em sua grande maioria, as comunidades terapêuticas não promovem ações que visam reconstruir os laços comunitários e a inserção social dos internos; não têm articulação com a rede SUS e SUAS do município; não promovem a construção de um Projeto Terapêutico Individualizado, com a participação do usuário e seu familiar, com alternativas de continuidade após a saída do estabelecimento.

Além disto, ocorre contenção física, isolamento e restrição à liberdade do usuário, que em muitos casos ainda é obrigado a participar de atividades de cunho religioso durante o período de internação. Há internações involuntárias, muitas vezes sem notificação ao Ministério Público; "contenções medicamentosas" sem avaliação e prescrição médica. Estas situações ferem frontalmente o disposto na Lei nº 10.216/01, a Lei da Reforma Psiquiátrica Brasileira, no que diz respeito a práticas manicomiais e de segregação. Todos estes pontos contrariam, inclusive, o próprio Edital nº 001/2010 do Plano Integrado de Enfrentamento ao Crack e outras drogas.

Portanto, defendemos a internação como último recurso, tal como a Lei da Reforma Psiquiátrica Brasileira estabelece, quando for necessário, que seja breve, realizada em hospitais gerais de referência ou nos serviços especializados da Rede de Saúde, como os CAPS-AD. A falta histórica de leitos e de serviços para pessoas que usam drogas deve ser suprida com o devido investimento em tratamentos e intervenções efetivas como os CAPS e a Rede de Atenção a Saúde Mental Pública (Hospitais Gerais, Casas de Passagem, Residências Terapêuticas, UBSs, Consultório de Rua, entre outros) que ofereça tratamento voluntário, atendimento especializado, interação com a rede intersetorial, família e comunidade, atenção integral e respeito aos direitos humanos. Além disto, deve ser fortalecida a atenção primária, por meio da formação continuada de trabalhadores e da colaboração de equipes de matriciamento, para atuar de modo mais efetivo na prevenção e recuperação do uso abusivo de drogas.

É urgente a efetivação dessa política inclusiva, humanizada, não discriminatória, que garanta o respeito à diferença, à singularidade e à integridade dos sujeitos, ao em vez de investimento em ações de emergência, como o apoio financeiro às comunidades terapêuticas, que muitas vezes acabam por aumentar a exclusão e o estigma vivido pelos usuários de drogas, não garantindo de fato a produção do cuidado necessário aos usuários de álcool e outras drogas.

Conselho Regional de Psicologia SP

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

SEMANA DE ESTUDOS DA PSICOLOGIA D.A. PSIU-UNISA

Dia 24 de agosto estivemos na Unisa convidados pela gestão colegiada do Diretório Acadêmico PSIU, que organizou a Semana de Estudos da Psicologia, debatendo o tema "A Cultura da Medicalização da Educação e da Sociedade".


A participação no debate foi muito produtiva abrindo à discussão diversos fatores e possibilidades referentes aos problemas enfrentados pela Psicologia na sociedade contemporânea.


 O tema da Semana de Estudos foi " A busca pelo objeto perdido", foco de discussão no nosso debate.


Comemoramos no dia 27 de agosto os 49 anos da regulamentação da Psicologia como profissão. Parabéns às Psicólogas e aos Psicólogos!!!!


Agradecemos o convite e a participação.

MANIFESTO CONTRA A PRÁTICA DA PSICOCIRURGIA

(PL Estadual 1051/2003)

Em Outubro de 2003, foi proposto pelo Deputado Enio Tatto do PT o projeto de lei 1051/2003. O PL inicialmente proibia a prática da Psicocirurgia no estado de São Paulo, e pagamento de multa pela não observância, sem prejuízo das demais medidas cabíveis. Na Justificativa, definia “psicocirurgias” como procedimentos cirúrgicos invasivos empregados com o objetivo de promover alterações de comportamento em pacientes psiquiátricos. Através dela, são destruídas partes do cérebro, que estão supostamente associadas a comportamentos que se deseja eliminar, como a agressividade, depressão, epilepsia e outros.

Em Novembro de 2010 o Deputado Pedro Tobias apresentou um texto Substitutivo ao projeto, em se posiciona no sentido de que “a proibição não é a melhor solução” (sic), além de apresentar requisitos para a realização do procedimento.

O CRP/SP vem acompanhando este PL desde o início. Nossa posição é clara: somos contra a Psicocirurgia, embora não regulamentemos a prática, por se tratar de procedimento médico. Diversos motivos nos levam a esta posição, dentre os quais:

1- De maneira geral, trata-se de uma técnica pouco eficaz, com possibilidade de graves seqüelas que podem limitar permanentemente a vida da pessoa submetida ao procedimento.
2- Temos historicamente nos comprometido com as garantias dos Direitos Humanos no tratamento à Saúde Mental e nos posicionado pela superação dos modelos manicomiais. Assim sendo, a prática fere a concepção ético-política que queremos imprimir, implicando em uma marca à pessoa em tratamento que contradiz a potencialização de sua autonomia e sua condição de sujeito ativo.
3- A posição do Ministério da Saúde, no âmbito do Sistema Único de Saúde é de que não está autorizada a realização de psicocirurgias, mesmo nas indicações terapêuticas atuais.
4- O Relatório Final da IV Conferência Nacional de Saúde Mental Intersetorial, realizada em 2010, tem como deliberação: "268. Manter a decisão do Ministério da Saúde de não remunerar Comunidades Terapêuticas, ECT (eletroconvulsoterapia), psicocirurgia e qualquer outra intervenção invasiva." No item de Direitos Humanos e Cidadania, Princípios e diretrizes gerais, consta: "608. Entre as várias diretrizes aprovadas nesta direção, se destaca a proposição de um marco legal para a abolição das práticas de tratamento cruel ou degradante, como lobotomia, psicocirurgia, eletroconvulsoterapia (ECT), contenções físicas e químicas permanentes, internações prolongadas e maus tratos físicos contra pessoas em sofrimento psíquico."
5 - A OMS – Organização Mundial de Saúde não a reconhece como técnica terapêutica, mas apenas como experimental. Tem sido questionada mundialmente, não só no Brasil. A psicocirurgia não é reconhecida pelas instâncias de defesa da saúde.
Procedimentos como a Psicocirurgia eram utilizados no início do século XX, época em que o uso da violência de mecanismos de punição como maus-tratos e negligências contra aquele que sofria com o transtorno mental era uma regra. Desde então, o cuidado à Saúde Mental sofreu uma transformação, através do reconhecimento da diferença, não patologização da diversidade humana e redes substitutivas de serviço.

Conheça o texto inicial do PL
Conheça o texto Substitutivo do PL
Envie manifesto aos Deputados Estaduais contra a prática da psicocirurgia


Conselho Regional de Psicologia / SP

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES


Ref: Projeto de Lei nº. 673/11 –internação compulsória de crianças e adolescentes usuários de droga
O Núcleo Especializado da Infância e Juventude da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, tendo por base as atribuições que lhes são inerentes, primordialmente na prestação de suporte e auxílio nas demandas que, direta ou indiretamente, refiram-se a direitos específicos ou gerais de crianças e adolescentes, vem, por meio dos seus coordenadores, formalizar posicionamento contrário ao Projeto de Lei nº. 673/11, proposto pelo Deputado Estadual Orlando Bolçone, que prevê internação compulsória pelo Poder Público de crianças e adolescentes usuários de droga para tratamento médico.
De acordo com o projeto de lei, a internação para tratamento médico ocorrerá independente da autorização dos pais, sendo estes apenas cientificados do local onde a criança ou o adolescente está recebendo o tratamento e das circunstâncias em que ocorreu a sua apreensão.
Mencionar o descaso histórico do Estado para com as crianças e adolescentes brasileiros, diante de um problema grave de ordem de saúde pública pode parecer, num primeiro momento, repetitivo.
Não é diferente quando se trata de Projetos de Lei como este que visa, tão somente, agravar a situação dessas crianças e adolescentes, uma vez que não prevê qualquer critério para o tratamento médico, psicológico, ou mesmo políticas públicas suficientes para enfrentar o problema, marginalizando a pobreza e fortalecendo estigmas preconceituosos.
Salta aos olhos daqueles que se dedicam à incansável busca da efetividade dos direitos assegurados por lei às crianças e aos adolescentes a problemática social a que se está prestes a enfrentar mediante a aprovação de um Projeto de Lei como este: não se nega, e prevê, a transferência do grave problema de saúde pública das ruas para estabelecimentos despreparados –acredita-se, inexistentes – sendo certo ser esta mais uma medida “higienista”,proposta em conflito com as garantias constitucionais.
Em que pese a superficialidade ao qual o tema internação compulsória foi tratado no Projeto de Lei, não foi possível esperar nada diferente da sua justificativa, em especial pelo vago depoimento do médico especialista em dependentes que supõe que caso morresse e seus filhos ficassem na rua, sua vontade era que o Poder Público cuidasse de seus filhos.
Sem adentrar ao mérito acerca da excessiva – e temerária - confiança depositada ao Poder Público e limitações institucionais tal projeto destina-se, único e exclusivamente, à crianças e adolescentes em situação de miséria cujo uso da droga, muitas vezes, é decorrente dessa condição social.
Nesse contexto, cumpre indagar o seguinte: se mesmo a internação para tratamento da dependência considerada ideal – estrutura adequada, apoio médico, psicológico, familiar e do próprio paciente – não é garantia integral de recuperação de tais pacientes que assumirão personagens da institucionalização irresponsável, o que se espera de uma internação que seja compulsória, massificada, desmedida, que desconsidera o apoio familiar e a vontade da criança ou do adolescente em receber o tratamento, conforme propõe o Projeto de Lei em comento? É no mínimo inconstitucional.
Lamentavelmente, não é possível esperar nada diferente de um grande depósito de crianças e adolescentes “dopados”, estabelecendo-se uma releitura dos antigos unidades manicomiais e abordagem menorista.
Diante da precariedade das políticas públicas brasileiras para crianças e adolescentes envolvidos com o tráfico e o uso das drogas, não se pode pensar em saídas imediatas enquanto o Estado não comprovar esforços para a implantação de políticas públicas na saúde, educação e assistência social, investindo em estratégias antidrogas: prevenção, por meio da conscientização; educação e tratamento adequado: clínicas públicas de reabilitação de qualidade, profissionais especializados, medicamentos suficientes, etc.
A respeito da estrutura atual das políticas públicas básicas e sociais destinadas para atendimento inicial de crianças e adolescentes, o Estado de São Paulo, com 645 municípios, possui apenas 58 Centros de Atenção Psicossocial de Álcool e Droga – CAPS-AD, e 216 Centros de Referência Especializados de Assistência Social – CREAS.
Não existe solução milagrosa para sanar o problema de saúde pública enfrentado pela sociedade, especialmente, quando se pretende impor tolerância zero e total abstinência para tratamento de suas crianças e adolescentes em situação de drogadição.
Todavia, existe a possibilidade de que seja colocado em prática o Estatutoda Criança e do Adolescente, normas de funcionamento do Sistema Único de Saúde- SUS e Sistema Único de Assistência Social - SUAS primordialmente na elaboração de programas de proteção integral da criança e do adolescente cujo intuito é priorizar a prevençãofrente à repressão.
Ou, ainda, levar em consideração, quando da aplicação das medidas de proteção (art. 100 do ECA), os princípios (i) que reconhecem a condição da criança e do adolescente como sujeitos de direitos (inc. I); (ii) de proteção integral e prioritária dos direitos de que são titulares as crianças e os adolescentes (inc. II); (iii) que respeite a intimidade e o interesse superior da criança e do adolescente (incs. IV e V); (iv) de intervenção mínima das autoridades e instituições (inc. VII); (v) de proporcionalidade e atualidade das medidas de proteção (inc. VIII) e; (vi) de prevalência da família na promoção de direitos e na proteção da criança e do adolescente (inc. X).
Infelizmente, enquanto falharem as políticas sociais básicas destinadas às crianças e aos adolescentes como saúde, educação, esporte, lazer, dificilmente se logrará prevenir o tráfico e uso das drogas.
Posto isso, por meio da presente manifestação perfunctória, a Defensoria Pública do Estado de São Paulo, por seu Núcleo Especializado da Infância e Juventude, reafirma sua posição contrária à aprovação do Projeto de Lei nº. 673/11 e lamenta a movimentação contrária à proteção da criança e do adolescente advinda de membros do Poder Legislativo do Estado de São Paulo.
Sendo o que nos cumpria para o momento, subscrevemo-nos, respeitosamente,
DIEGO VALE DE MEDEIROS E LEILA ROCHA SPONTON
Coordenadores do Núcleo Especializado da Infância e Juventude
DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULo

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